Passado no presente, presente no passado: “Em busca do tempo perdido”

Nove de Março de 2022. Rotterdam. Andamos quase dez quilómetros. Em busca do passado no presente e do presente no passado. Um modo de sentir a cidade nas suas diversas temporalidades e de sublinhar a importância das memórias, coletiva e individual, na compreensão das suas formas e da sua consciência (Rossi, 1966). Encontrar na trama urbana vestígios das tensões e conflitos que “apagaram” uma memória em detrimento de outra, discussão entre o passado e o presente. “Histórias de fantasmas para gente grande” (Walburg, 2015). Uma cidade sem coração.

A

Objetos de ferro antitanque, feitos por uns serralheiros de Rotterdam para mostrar solidariedade. Prédio da Câmara Municipal (Stadhuis Rotterdam), poupado no bombardeamento pelos alemães. Numa das torres, figura agora a bandeira da Ucrânia. Uma série de street art em tons de azul e amarelo na Plein 1940 onde está a escultura “Cidade destruída” (De Verwoeste Stad, 1953) de Ossip Zadkine, um memorial da enorme destruição do centro da cidade perpetrada pelos nazistas alemães em 1940. Simboliza a cidade a sofrer porque o seu coração foi tirado. Um enorme vazio ficou.

B

Academia de Belas Artes de Rotterdam, Willem de Kooning Academie. Um dos muitos poucos prédios no centro que sobreviveu ao bombardeamento. Na altura era um banco de prestígio. Um rumor diz que Hitler mandou poupar esse prédio porque o dono era um fascista nazista. Um rumor que não foi provado. Ao lado da academia, outro prédio, construído no pós-guerra, muito tempo depois. Detrás da academia, prédios novos, bastante recentes.

C

WitteHuis, ou seja, Casa Branca, construída em 1898 em estilo Arte Nova, com uma altura de 45 metros. Era, então, o prédio mais alto da Holanda. Um skyscraper, estilo americano daquela altura. Ao lado esquerdo, primeiro, edifícios velhos, seguidos de modernos e altos. Pequena parte que também sobreviveu ao bombardeamento.

D

Prédio pós-guerra ao lado de prédio pré-guerra.

E

Canal Haringvliet, que data de 1590. Estátua para os Mariniers. Forças especiais tipo comandos que defenderam as pontas da cidade sobre o rio contra invasão dos alemães vindos do Sul. Muito irónico. Defenderam bem demais. Por isso, Hitler zangou-se e decidiu bombardear a cidade. E disse que Amsterdam seria a cidade que se seguiria. Rendição incondicional ou bombas.

F

Na fronteira do fogo. Focos de luz colocados no chão (nos locais onde as bombas caíram). Há centenas destas marcas que formam uma linha. Só acendem na noite de 14 de maio, dia do bombardeamento da cidade. A Igreja protestante gótica St Laurens Kerk que também sobreviveu. Fotos expostas no interior da igreja que mostram como era antes do bombardeamento.

G

Schielandhuis, construído no século XVII (1660). Muito dissonante — só prédios novos à volta. Infelizmente não podia ter tudo numa só imagem. Schielandhuis espelhado num prédio moderno ao lado.

H

Outro monumento — Delftse Poort  — que simboliza a reconstrução da cidade. Um Poort é um portão de entrada numa cidade. O antigo portão da cidade em Rotterdam, um projeto do arquiteto Pieter de Swart, foi construído em Hofplein no período de 1768-1773. Até 1940, o portão de pedra da cidade era o ícone da cidade. Por dentro, velhos artefactos daquelePoort queimados.

 I

West Kruiskade. Onde coabitam o velho e o novo. Prédio moderno à direita e à esquerda os velhos pré-guerra. Westersingel. Idem, mas do lado oposto, ao entardecer.

Texto: Zara Pinto-Coelho e Willem Kramer

Imagens: Willem Kramer

Publicado a 11-04-2022

Referências

Rossi, A. (1982/1966). The architecture of the city. The MIT Press.

Warburg, A. (2015). Histórias de fantasma para gente grande. Escritos, esboços e conferências (Org. L. Waizbort; Tradução L. B. Bárbara). Companhia das Letras.

 

 

LOCALIZAÇÃO

LOCAL: ZH

LATITUDE: 51.9244201

LONGITUDE: 4.4777325